Barbosa, seleção brasileira.
Futebol, Futebol de Seleções

A pena perpétua de Barbosa, goleiro do “maracanazo”

Daniel Dutra
Siga-me

Culpado pela derrota do Brasil na final da Copa do Mundo de 1950, Barbosa morreu duas vezes. A primeira, aos 29 anos. E a última, aos 79.


Destaque da seleção brasileira até a década de 1950, Barbosa foi um dos melhores goleiros de sua geração. Sua maior característica era ser completo. Tinha segurança, era focado, tinha elasticidade, saía bem do gol, defendia de mão trocada e ainda tinha um bom posicionamento. Começou no Ipiranga de São Paulo, no início da década de 1940, despertando o interesse de grandes clubes. Pouco tempo depois, foi contratado pelo Vasco para substituir Rodrigues, um goleiro que abandonou o futebol após ganhar 200 mil cruzeiros na loteria. Pelo Vasco, Barbosa fez 400 partidas e tornou-se um dos jogadores que mais vestiu a camisa do clube, conquistado seis campeonatos cariocas (45, 47, 49, 50, 52 e 58), um campeonato Sul-Americano (1949) e um torneio Rio-São Paulo (1958).

Pelo bom desempenho no clube carioca, Barbosa era figura certa na seleção brasileira. Portanto, em 1950, foi convocado como destaque para a primeira Copa do Mundo no Brasil. Nossa seleção chegava como favorita ao título, e os primeiros resultados já animavam o torcedor. Na fase inicial, venceu o México por 4 a 0 e a Iugoslávia por 2 a 0. Na fase seguinte, 7 a 1 na Suécia e 6 a 1 na Espanha. Certamente, o clima de “já ganhou” pairou no ar e foi assim até o dia 16 de julho.

Chegando embalado na final, o Brasil colocou 200 mil pessoas no Maracanã, estádio construído para essa Copa. Seria enfim o primeiro título mundial do Brasil. Mesmo jogado por empate, nossa seleção abriu o placar para a euforia dos milhares de brasileiros presentes. Entretanto, tinha jogo pela frente.

O início do pesadelo

Barbosa foi ídolo no Vasco, onde atuou 400 vezes. Crédito: Folhapress
Barbosa foi ídolo no Vasco, onde atuou 400 vezes. Crédito: Folhapress

O cronometro era favorável ao Brasil, com duas vantagens no placar. Contudo, o Uruguai conseguiu empatar a partida. Mas nada que abalasse a alegria dos brasileiros nas arquibancadas. O empate continuava dando o título ao Brasil. Pelo menos até os 11 minutos do segundo tempo, quando Chiggia virou para o Uruguai, calando completamente o Maracanã. A partir desse momento, qualquer euforia foi embora. O estádio permaneceu incrédulo até o final da partida, que terminou com o Uruguai campeão em pleno Maracanã.

Após a derrota, hora de achar os culpados. Primeiro, Bigode, que deixou o atacante passar, depois, o principal: Barbosa, que supostamente deixou a bola passar. Coincidentemente ou não, os culpados foram os jogadores negros. Depois disso, entre os goleiros negros, apenas Dida e Jefferson conseguiram ganhar titularidade na Seleção Brasileira. Apenas Dida em Copa do Mundo. Recentemente (2020), o ex-jogador Edílson declarou na TV que: “goleiro negro na seleção brasileira dá azar.” Nelson Rodrigues escreveu quase 10 anos depois da final (1959), um fato sobre a pena de Barbosa:

“Quando se fala em 50, ninguém pensa num colapso geral. O sujeito pensa em Barbosa, o sujeito descarrega em Barbosa a responsabilidade maciça, compacta, da derrota. O brasileiro já se esqueceu da febre amarela, da vacina obrigatória, da gripe Espanhola, do assassinato do senador Pinheiro Machado. Mas o que ele não esquece, nem a tiro, é o chamado frango de Barbosa”.

Infelizmente, Barbosa não carregou essa culpa “apenas” na década de 1950. O goleiro ficou marcado mesmo após a aposentadoria. Nem mesmo depois de sua morte, Barbosa tem descanso. Até hoje ele é lembrado por alguns, como: “o homem que fez o Brasil chorar”.

A pena perpétua de Barbosa

Ex-goleiro do Vasco.
Barbosa pagou até a morte por um crime que não cometeu.

“No Brasil, a pena máxima de prisão é de 30 anos, mas pago há 40 por um crime que não cometi”. – Barbosa.

Barbosa costumava repetir a frase acima décadas depois do ocorrido. Ele tentava de toda forma provar não só para os outros, mas para ele mesmo, que ele não era o culpado pela derrota brasileira. Durante muito tempo, o ex-goleiro teve medo de andar pelas ruas. As pessoas sempre apontavam para ele e dirigiam xingamentos. Em 1993, Zagallo aconselhou o ídolo vascaíno a não tirar foto com Taffarel para não “manchar a sua imagem” em caso de derrota do Brasil. Acatando o conselho, o fotógrafo ficou irritado e disse que Barbosa foi impedido de visitar os jogadores na concentração da seleção brasileira.

No início da aposentadoria, Barbosa virou funcionário do Maracanã, mas alguns anos depois, foi embora do Rio de Janeiro para viver em Praia Grande, no litoral de São Paulo. “O Barbosa veio embora porque no Rio cobravam muito dele. Uma irmã dele chamou então ele para vir para cá. E aí ele se apaixonou pela cidade”, diz Tereza Borba, filha do ex-goleiro.

Até o fim da vida, Barbosa foi apontado como culpado. “Ele já chorou no meu ombro. Sempre dizia: ‘Eu sei que não sou culpado. Éramos 11′”, disse Teresa Borba em matéria da Folha de São Paulo do dia seguinte à morte do goleiro. Barbosa morreu duas vezes. A primeira, aos 29 anos. E a última, aos 79.

Daniel Dutra

Jornalista em formação e apaixonado por esportes. Juntei essas duas paixões para produzir conteúdo e valorizar a comunicação criando um portal para levar informação e gerar oportunidades.
Ler todas as publicações de Daniel Dutra
0 0 votes
Article Rating
Subscribe
Notify of
guest

0 Comentários
Inline Feedbacks
View all comments