Heleno de Freitas.
Futebol, Futebol Nacional

Do Botafogo ao sanatório: a história do primeiro badboy do futebol brasileiro

Daniel Dutra
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Heleno de Freitas, o príncipe maldito e o primeiro badboy do futebol brasileiro. Essas são algumas nomeações para o ídolo botafoguense pré-Garrincha. Sua história rendeu filme e livros, sejam biografias ou citações. Certamente, Heleno é um personagem único e fascinante.


Heleno de Freitas nasceu em 1920, no município de São João Nepomuceno, Minas Gerais, onde possui uma estátua. Entretanto, foi cedo para o Rio de Janeiro cursar Ciências Jurídicas e Sociais pela Faculdade de Direito da UFRJ. Seu pai, dono de um cafezal e outros negócios, rendeu o título de alta sociedade para a família de Heleno. Contudo, o intempestivo galã gostava da adrenalina e, além das mulheres e noitadas, tinha o futebol como sua paixão.

“O Heleno transcende o fato de ser um jogador de futebol. Ele é um dos personagens brasileiros mais fascinantes de todos os tempos. Ele escolheu ser jogador de futebol pelo ego de querer ser aplaudido por 40 mil pessoas, mas poderia ser um diplomata, seguir carreira no direito. Ele seria relevante e de sucesso em qualquer área”. – Marcos Eduardo Neves na biografia “Nunca houve um homem como Heleno”.

Mesmo com 1,82 metros de altura, Heleno tinha muita técnica e começou a carreira como meio-campo. Além de distribuir bem o jogo, o jogador conseguia chutar para o gol mesmo recebendo a bola de costas para o alvo, algo que nenhum atleta fazia na época. Essa plasticidade pode ser lida no livro “O futebol ao sol e à sombra” de Eduardo Galeano, que descreveu um famoso gol de Heleno ocorrido em 1947 contra o Flamengo.

“Heleno estava de costas para o arco. A bola chegou lá de cima. Ele parou-a com o peito e se voltou sem deixá-la cair. Com o corpo arqueado e a bola no peito, enfrentou a situação. Entre o gol e ele, uma multidão. Na área do Flamengo havia mais gente que em todo o Brasil. Se a bola caísse no chão, estava perdido. E então Heleno pôs-se a caminhar, sempre curvado para trás, e com a bola no peito atravessou tranquilamente as linhas inimigas. Ninguém podia tirá-la sem fazer falta, e estavam na zona de perigo. Quando chegou às portas do gol, Heleno endireitou o corpo. A bola deslizou até seus pés. E ele arrematou.”

O faro de gol acabou adiantando-lhe para o ataque. Pelo Botafogo, foram 204 gols em 233 partidas, o quarto maior artilheiro da história do clube. Na Seleção Brasileira, 15 gols em 18 jogos durante os quatro anos em que vestiu a amarelinha. Mas não foi só a técnica que marcou o jogador. Seu temperamento explosivo, rendia-lhe expulsões e brigas com os próprios companheiros de time. Em uma ocasião, ao ser expulso, recusou-se a sair de campo.

Gênio forte

Heleno foi daqueles jogadores que se garantiam. Assim como Romário e Túlio Maravilha, dizia que faria muitos gols, mas reclamava dos companheiros de equipe, dizendo que sempre tomavam mais gols do que ele fazia, independente da quantidade. Como atleta, não era um grande exemplo, pois não cuidava da saúde e fumava até nos treinos.

Mulherengo, Heleno de Freitas morava no Copacabana Palace, um dos hotéis mais famosos do Brasil. Alto, forte e elegante, as noitadas eram frequentes na vida do mineiro. Durante essas aventuras, ficava bêbado, usava éter e acabou pegando sífilis. Todavia, nunca quis se tratar de verdade, e a doença foi preocupando os médicos ainda na época do Botafogo. Em paralelo, ele foi ficando assustado, mas nunca deixou de curtir o Rio de Janeiro e acabou casando-se com Ilma, que mesmo sabendo de todos os problemas, aceitou Heleno e teve o único filho do jogador.

Após o Botafogo perder o Campeonato Carioca para o Fluminense, com quem Heleno tinha grande rivalidade, o jogador surtou. Na época, a torcida tricolor chamava ele de “Gilda”, em referência a uma personagem da dramaturgia que era esquentada. Devolvendo as provocações, Heleno penteava o cabelo enquanto encarava a torcida adversária.

Depois de perder a final, Heleno foi vendido para o Boca Juniors da Argentina para salvar as finanças do Botafogo. Na época, foi a maior venda de um clube brasileiro. Entretanto, o jogador ficou totalmente irritado e saiu do clube dizendo uma frase que ficou marcada para sempre:

“Eu não sou jogador de futebol, eu sou jogador do Botafogo.”

O declínio de Heleno de Freitas

Heleno de Freitas.
O vício sempre fez parte da vida de Heleno. Seja por álcool, cigarro, éter ou mulheres.

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Na Argentina, as notícias diziam que Heleno não conseguia se adaptar. Pelo menos dentro de campo, pois fora dele, surgiram rumores até de um caso com Eva Perón, atriz e primeira-dama da Argentina. Por lá, o primeiro jogador a ser entrevistado por uma Rádio Brasileira virou correspondente do jornal “Diário Carioca”. Ainda assim, forçou sua volta para o Brasil em uma tentativa de jogar no Botafogo, o que não aconteceu. Sem ele, o alvinegro conquistou melhores resultados. Com isso, foi para o Vasco da Gama, onde arrumou diversas confusões com o treinador Flávio Costa. Sem treinar, foi dispensado e ficou de fora da sonhada Copa do Mundo de 1950 no Brasil.

Foi no Junior Barranquilla da Colômbia, onde ganhou o apelido de El Heraldo de Barranquilla, que Heleno soube da derrota brasileira para o Uruguai na final conhecida como “Maracanaço”. Motivo para mais um surto do jogador, que já estava no auge de sua bipolaridade. Ele não conseguia engolir ter ficado de fora do maior sonho de sua vida, que era jogar uma Copa do Mundo no estádio recém-construído.

“Se eu estivesse jogando, o Brasil seria campeão. Eu matava o Obdúlio Varela! Eu seria expulso, mas o Ademir ganharia aquele jogo sozinho. Ademir tinha medo dele (Varela). Eu não!” – Heleno de Freitas.

De volta para o Brasil, tentou realizar pelo menos o sonho de jogar no Maracanã. E conseguiu, prometendo que iria se tratar. Mas foi seu único jogo como atleta do América-RJ. Fiasco total, encerrando de vez a carreira que um dia foi brilhante. Sem a esposa Ilma, sem o futebol e sem a beleza que atraía a mulherada, Heleno de Freitas foi parar em um sanatória em Barbacena, Minas Gerais, onde viveu por 5 anos até morrer aos 39 anos de idade.

Daniel Dutra

Jornalista em formação e apaixonado por esportes. Juntei essas duas paixões para produzir conteúdo e valorizar a comunicação criando um portal para levar informação e gerar oportunidades.
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